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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Pendurado num Tróleibus de Cem Anos - Fevereiro 20

No dia seguinte, o sol lançava um convite de alugar bicicletas e se lançar à brisa da cidade, com o que também concordaram um alemão e um austríaco que se juntaram ao grupo. Possivelmente poderíamos dar uma olhada na histórica, assustadora, assustada, prisão de segurança máxima Alcatraz (Pelicano, do espanhol). Alugamos, fomos de bicicleta – mit dem fahrrad, do alemão deles. Pela Ponte do Portão Dourado - Golden Gate Bridge-, famosa, tem-se uma extensa visão, aterradora, de toda a orla, olhos-terapia. Para voltar ao centro da cidade, pegamos o ferry – navio que passa próximo à Alcatraz, com as bicicletas, de volta ao leste. Esperando pelo barco, sustentando os mais diversos assuntos de interesse internacional; também pudemos contemplar um senhor que tocava violentamente seu violão, no que ajoelhava-se ao chão, e transmitia, em seus gestos faciais, um sentimento de arrebatamento. Sua gradação músico-teatral evoluiu até que ele caiu no chão, fingindo-se de morto. Mais tarde e por outro lado, por assim dizer, os europeus alugaram um conversível e desceram para Las Vegas e Grand Canyon.

A segunda-feira propôs contemplar a visão da cidade de cima da Torre Coit, que fica no topo de uma colina. Infinitos degraus e casas encaixadas no abrupto oblíquo, no contexto da subida, me lembraram bastante a clássica favela. A infraestrutura e padrão das casas, entretanto, tomava a liberdade de desmentir minha memória. A baía como um todo e a famosa ponte que liga Sausalito e San Francisco podiam ser vistas lá de cima. Não entramos na torre: era caro. Em vez disso, eu e Cory preparamos um picnic no pé da torre, antes de seguir para a lenta rua Lombard. Famosa por suas curvas extremas e breves, a rua Lombardi é sinuosa devido à inclinação do terreno. Dessa forma, as voltas redundantes da rua são mais uma atração turística do que uma simples rua de trânsito devagar.

Histórico é andar num tróleibus que tem mais de cem anos; e vai-se pra frente! Trata-se de um pequeno trem que percorre um trilho, na rua; todo aberto, o veículo permite viajar pendurado; eu quis. O movimento do trem é baseado num cabo metálico, subterrâneo, que nunca para, para o que frear significa soltar do cabo, e acelerar, segurar no cabo. Pela minha experiência com coletivos, tive de notar: Como que sai? Desce? Os dois ônibus regulares em que entramos tinham um detalhe, para mim inédito, no desembarque. Para que a porta abrisse, o passageiro deveria ou empurrá-la ou descer um degrau; dar sinal e esperar não funcionou em São Francisco, dou fé. São Franciso anoitece somente para os olhos, mas não dorme.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O mais populoso dos Estados Unidos - Fevereiro 19


Mal era dia: a temperatura que não se mede, mas  que se verifica na face, congela-se. Frio, a pressa intrínseca, interna, mais o calor do porvir. Com direito a um bom dia pela antiga linha de tróleibus Mattapan-Ashmont, que contém um portal para o tempo, para onde o bilhete não era mais vendido; era o ontem mandando ir para a frente. Na Estação Sul – South Station -  o encapuzado rapaz da Ônibus Bolt gritava, compasado, mas estridente, numa linguagem voltada dos expectadores, semi-universal: "Nova Iorque, 8 da manhã, Nova Iorque!" .

Desafio é dar nome aos segundos! Mas as horas eram só quatro, no que dava para pensar sem cansar. Salvo o conhecido: ao meu lado um homem pergunta de onde eu sou; e ri – Sou casado com uma brasileira! Esse é meu filho, está indo para Belo Horizonte. Ao que contei-lhe que eu pegaria um voo de muitas milhas, em algumas horas, para São Francisco. Artisticamente o estadunidense manobrava o português, quase fluente. Cansaço que houvesse, estrada-estrada, uma prosa simpática decorreu-se até Manhattan.

 O voo: noturno. Tomamos café da manhã na cidade de Nova Iorque, no Mud. O calor abafado no interior do ambiente convidava incontinenti para comermos. No meio tempo entre o voo e o ócio, quando se define, encontramos o amigo do Cory, o qual trabalha para a Google , com quem andamos sem rumo pela Broadway e outras ruas. No fim da tarde, já não tínhamos o tempo todo, seriam mais de vinte estações de metrô até o JFK – aeroporto -, sabendo-se, infelizmente, que um voo é um tanto imperdível; esse mal cálculo nos levou a tomar um táxi – yellow cab. Conforto tem preço, você dirá; mas falamos sobre política com o motorista haitiano, pelas ruas da interminável cidade.

Na poltrona ao meu lado, a senhorita levava um cachorrinho yorkshire cego de um olho. Cachorros que não lambem, adoro; aquele me incomodava. Isso não sucedeu maiores intercorrências. Devo fazer ponto à inevitável imobilidade a que fui submetido, pois do lado oposto do yorkshire havia uma figura antipática, desagradável e que dormia para sempre. Ou quase, por infortúnio: se para sempre, não roncaria. Em São Francisco, o moderno aeroporto e o trem bart fazem as boas-vindas: espelho do desenvolvimento sudoeste. Estávamos na Califórnia, bela e singular, dez graus a mais e três horas a menos com relação a Massachusets. Desembarcando algum tempo depois do bart, na estação Montgomery, dirigimo-nos a um hostel chamado Pacific Tradewinds. Localizado quase dentro do bairro chinês da cidade, esse hostel mostrou-se bastante receptivo e confortável, até devido às figuras ímpares que se alternavam na recepção.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Das Preparações Histológicas - Fevereiro 13

Despertadores nunca foram meu forte, atesto; mas tive a impressão de sonhar com algo do bem, por assim dizer. A monotonia do despertador foi desequilíbrio perverso, fino, entre o magnetismo dos lençóis e o frio lá fora. Aceitando a carona de meu amigo Cory, eu adiaria por mais um dia a caminhada gelada pela madrugada da Canton Avenue, para pegar o ônibus da Joseph’s Transportation.

À tarde terminamos o que demos início ontem: cortes de pulmões, coração, rins e baço de ratos, fixados em formol, devidamente identificados, e transmitidos para as cassetes, também imersas em formol, no imediato. Almocei o que guardei da comida chinesa de sábado, a qual comprei na busca por arroz: um simples excesso. O fato de haver comida brasileira em Stoughton Town não me liberou do arroz japonês; talvez pela distância, talvez pelo preço. O fato é que voltarei, ainda, nem que seja pelo cartão telefônico "Voz do Brasil", lá vendido. Embora nada substitua o Byriani indiano - à base de arroz-, minhas economias distraem a atenção para opções mais populares.

O formato que o corte dos pulmões tomava nos remetia às remotas aulas de histologia no Instituto de Biomédicas (refiro-me às ciências!) da indissolúvel Universidade de São Paulo. Fomos tomados de um entusiasmo mergulhado em uma nostalgia-formol, que rápido passou – refiro-me à nostalgia - , mas deu um toque de simplicidade em minha tarde. O café cheiroso – flavored – do décimo terceiro andar, acabou. Ninguém disse que só viriam notícias boas, mais para mais do que para menos; a impressora que o Edgar trouxe não quer puxar as folhas. Paciência.

 A conferência do meio dia teve como tema uma pesquisa sobre hipersensibilidade, do tipo IV, salvo engano; atrativos padrões norte-americanos de ordem nutritiva foram gentilmente oferecidos – lunch provided; diga-se chips, sanduíches, coca-colas e gordos cookies.

Alguns, vendo meu histórico comportamental – que não se elabore tal documento –, dirão que minha desistência das aulas de línguas é uma repetição observada anteriormente em São Paulo. Eu me defendo: quanto mais gosto da matéria, mais cobro da aula e menor é a aderência, de fato. Reitero que a evasão é saudável, e é de direito,  pois que eu ocuparei as horas estudando no meu compasso, que, para o bem ou para o mal, está calibrado com a minha velocidade. Essa semana devo terminar de ler Maigret et la Jeune Morte, que se enquadra na frente de estudos que chamei de francesa. A frente russa vai aos passos tímidos, escassos, minguados, apoucados, дефицитный, e a latina, experienciando uma pausa. Permita-me que compartilhe uma sensação épica: aprender gramática do latim com o texto original da Guerra de Troia; excelente. Quantos ao inglês, planejo mexer na gramática da casa dos O’Hayer, em breve, utilizada pelo Cory há alguns anos.
No mais, limpou-se o laboratório ao lado, pelo que observei do movimento de entra-e-sai, e com que empenho! Dir-se-ia mais tarde, um transeunte, que a inspeção intransigente de Harvard passaria amanhã; e dissolve-se minha impressão de coincidência, como numa manobra de limpeza.

Não vejo a hora de ir para São Francisco... Impressões da baixa claridade. A noite caiu como uma luva e eis que paira um cansaço criativo sobre o ambiente, como quem não quer nada.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Longe Away, Lounge Auê, Does o quê?

Um conhecido meu mudou para São Paulo, contra as expectativas da família; prometeu que trabalharia e calaria a todos. Mas ninguém disse nada! Já um primo mudou de rua para evitar os fatídicos alagamentos da casa anterior. Quando eu digo que moro lá e cá, só o pessoal de Várzea Alegre que acredita. 
O que faz você mudar de casa?

Tia Fransquinha falou para eu lembrar da minha mãe, a pedido. Nunca esqueci, retruquei, é que sair de casa má agoura, pode? Peço sempre a benção e, quando posso, mando lembrança para terceiros. No momento, em que posso ligar, evolui-se para fácil a possibilidade de atualizar a todos vocês. Tudo bem assim? Desculpem a demora, é que o check-in atrasou duas horas.

Mudei muitas vezes, dando a impressão de que o Conhecimento corre e eu vou tento pegar. Quase isso: corro junto, e ele vai mudando de endereço. Objetivo assim, registrar infielmente meu dia-a-horas, não porque mudei de endereço, ou quero registrar o falso, o inverossímil, mas quero diversificar e criar um ponto de apoio para olhos cansados.

Ora, se eu persigo Conhecimento, haverá os caçadores do Novo. E se não posso esquecer, crio a facilidade de você me ler, ajudando a lembrar.

Eles não deram mais notícia, devem estar trabalhando. Também os que não se mudaram: todos estão ocupados. Amigos de sete ou oito calendários, deixo aqui escrito para quando chegarem em casa. Na sequência dessa importunância de ordem introdutória, peço para dar o recado a quem perguntar:
"Não passei frio, boas vestes, no que fui, por assim dizer, muito bem recebido.
Não esqueci a toalha nem a escova de dentes.
Os americanos não comem todos os dias em pratos descartáveis, ou copos, mas bem frequentemente; nem amam o McDonalds tanto quanto eu pensava.
Estou dormindo cedo, na medida do possível e do demandado.
A neve não suja, só molha, e as botas de neve fazem os pés suarem quando acima de zero grau.
A vontade de ir para casa eu vou enganado com comida, e pedindo, quando posso, pra por salada: não quero engordar a saudade. Mesmo assim devo ter ganho uns quilinhos.
Tranquei a porta, empurrei o lixo pra debaixo do guarda-roupa e joguei a chave junto.
Café com Coca-cola tira o sono sim.
Molecular ou suja ou livre de ácido: Não estou misturando as águas no laboratório, nem lavando roupa branca com roupa colorida, não ainda.
Os ratos comem duas vezes, mas se der três, eles comem; não tentei as quatro com medo de matá-los. Antes morram de fome, o que seria uma falha mais humana de minha parte.
Espero que o cartão-postal tenha chegado. Desconsidere, por favor, os erros de português.
Mande notícias quando puder,
Hilário Francelino."