Esquecesse a primavera que houve inverno e esse dia seria possível: mais
de vinte graus em Boston. Foi dia de conferência no Brigham and Women’s Hospital. O ser
humano é conhecidamente simétrico. Bilateralmente, como todos os animais
biologicamente superiores. Esta manhã, uma palestra me chamou a atenção para as
poucas excentricidades que temos, seus determinantes e, portanto, a definição
de sua vitalidade. Voltando aos primórdios embriológicos, nos primeiros
dias do desenvolvimento, na parte póstero-superior da notocorda, um movimento
para a esquerda de um fluido determinará a existência do coração, previamente
assinada pelo mesoderma lateral.
Já a conferência sobre
a função de determinadas células inflamatórias de nosso corpo (células T de
memória) me deu uma luz sobre algumas dúvidas que ficaram penduradas desde a
última vez que li um artigo. Se isso soa distante, é engano; é puro feriado
prolongado.
Agora, voltando ao
eixo, será que nascemos assim, duas metades? Começa-se bem. Em estudos envolvendo técnicas de silenciamento de genes e
análise patológica de defeitos congênitos, descobriu-se que o movimento de
meros cílios é responsável pela mais primitiva quebra no balanço do eixo
humano. Por trás disso tudo, há estudos sobre a importância desses cílios
de estarem posteriormente orientados, o que é determinado pela polaridade das
células planares. Moléculas como a inversina e cascatas de sinalização
relacionadas à polaridade dessas células são muito influenciadas por genes como
Angl1 e Angl2, cujo estudo em ratos revelou anomalias cardíacas que
vão desde uma má-orientação no eixo cardíaco até transposição de grandes vasos.
Adicionalmente, um paciente sem expressão da inversina nasceu com
transposição e comunicação arteriosa. Assim, a ciência fatia e passa manteiga.
Em nome do feriado,
trago notícias da terceira maior cidade dos Estados Unidos, onde o vento não
pára e a praia é de água doce. Refiro-me a Chicago, com seu belíssimo Lago Michigan. Na oportunidade, visitei diversos
pontos culturais importantes, incluindo o Museu de Cirurgia, onde equipamentos
do início do século passado e trabalhos científicos de ponta recentes
extremavam-se, ocultavam o meio-tempo, lançavam os dados da medicina. Os genes da simetria ficaram por digerir na minha mente. Na praça
do milênio, em frente ao super espelho em forma de feijão tirei fotos que distorciam
os tão vital eixo humano. Será que do outro lado do espelho os genes são
outros? Ou a embriologia já não é lei naquelas terras?
De posse de muitos
dados dos ensaios laboratoriais, eu não tardaria a precisar de uma revisão de
bioestatística, o que está tendo alta significância para o meu entendimento
científico. Ainda no laboratório, cada vez aprende-se mais o quanto algumas
coisas se contaminam facilmente, se não manipuladas de forma adequada. Atenção
especialmente para as quantificações do tipo RT-PCR, dado que as enzimas RNAses
são onipresentes. Felizmente, sou muito bem acompanhado no laboratório. Você dirá que essa acurácia é muito surreal para se preocupar. Mas
a ciência é mesmo detalhes.
Os estudos mostram como falhas no desenvolvimento da
pouca assimetria que temos afeta órgãos importantes, destacadamente o coração; havendo, assim, muitos estudos ainda nesse mundo. As
viagens mostram que há outros mundos, o que aumenta o número de estudos que a
ciência precisa fazer. Os feriados mostram que lazer também é cultura e
descanso, passível de provações estatísticas. Abstraindo da excentricidade
da primeira pelestra, temos na essência do ser humano um eixo elusivo,
desviado, guardado sob uma crosta espelhada, simétrica, que emana e muitas
vezes requer simetria na interface com os semelhantes.
Ao percorrer as linhas de um texto amigo me lembro do camundongo bêbado, criado por um egocentrico enamorado pelas teorias Hitlerianas, eugenista por suposto que buscava "simetrificar" uma especie.
ResponderExcluirTanto fez que criou a "inbred" mais "pop" dos "labs".
Nos primórdios da ciencia o legal era assimetria, ver as diferenças aqui e acola ja diria Charles Darwin.
Pois me parece que meu colega aqui do lado captou uma das varias essências dessa estranha coisa chamada ciencia!